quarta-feira, 20 de novembro de 2019

A APOLOGÉTICA DE TOMÁS DE AQUINO | PROF. CRISTIANO

São Tomás de Aquino (1225 – 1274), nasceu em Nápoles na Itália,  se tornou monge dominicano e mais tarde tornou-se professor da maior universidade de Paris. Vimos que Santo Agostinho cristianizou Platão, Tomaz de Aquino vai fazer o mesmo com Aristóteles ao usar sua teoria filosófica para explicar a fé e até mesmo a existência de Deus. A influência de seu pensamento penetrou toda a Europa a ponto de ele ser considerado o conselheiro dos conselheiros dos reis. Sua obra principal foi a Suma Teológica. Ele inverteu o lema de Santo Agostinho “crer para entender”, pois para ele é preciso primeiramente “entender para crer”. Apesar de dar uma valorizar na razão, ele também a entendia como a serviço da fé. Inclusive, sua obra se tornou uma possibilidade de diálogo com os pagãos que não compartilhavam da fé cristã para dessa maneira talvez covertê-los ao cristianismo. Discutindo com os judeus, podemos assumir como pressuposto o Antigo Testamento; discutindo com os heréticos, podemos assumir toda a Bíblia. Mas que pressuposto pode tornar possível a discussão com os pagãos ou gentios senão aquilo que nos assemelha, isto é, a razão?


Para ele a teologia não substitui a filosofia
Em Tomas de Aquino há uma razão e uma filosofia como preparação para a féA filosofia tem sua autonomia, mas não dá conta de tudo o que se pode dizer ou conhecer. Por isso, é preciso integrá-la a tudo o que está contido na Bíblia em relação a Deus, ao homem e ao mundo.
Nesse sentido, a diferença entre a filosofia e a teologia não está no fato de que uma trata de certas coisas e a outra de outras coisas mas no fato de que a filosofia oferece um conhecimento imperfeito daquelas mesmas coisas que a teologia está em condições de esclarecer em seus aspectos e conotações específicos relativos à salvação eterna.
Ou seja, a fé melhora a razão assim como a teologia melhora a filosofia. A graça não suplanta, mas aperfeiçoa a natureza. E isso significa duas coisas:
  •  a) a teologia retifica a filosofia, mas não a substitui, assim como a fé orienta a razão, não a elimina;
  •  b) a filosofia, como preparação para a fétem sua autonomia, porque é formulada com instrumentos e métodos não assimiláveis aos da teologia.
É preciso partir das verdades “racionais”, porque é a razão que nos une. É sobre essa base que se podem obter os primeiros resultados universais, porque racionais, com base nos quais se pode depois construir um discurso de aprofundamento de caráter teológico.
Por fim, Tomás tinha a convicção de que, apesar de sua radical dependência de Deus no ser e no agir, o homem e o mundo tem relativa autonomia, e isso leva a uma reflexão com os instrumentos da razão pura, fazendo frutificar todo o potencial cognoscitivo para responder a vocação original de “conhecer e dominar o mundo”.


De acordo com a sua TEORIA DO CONHECIMENTO, o homem é um ser duplo, composto por um corpo material e por uma alma inteligível. O homem conhece porque é alma, mas não tem acesso direto a Deus porque também é corpo.
Nosso conhecimento sempre parte dos sentidos, mas atinge o inteligível por meio da abstração. Desse modo, a teoria tomista do conhecimento é a do realismo, ou seja, considera que os conceitos que apreendemos pelo conhecimento possuem uma realidade autônoma e objetiva. O que a faculdade do conhecimento recebe do objeto é uma impressão deste. O que primeiro conhecemos são essas impressões, porque elas remetem de forma intencional ao objeto observado.
Tomás fixou-se num realismo moderado, tomando como ponto de partida o ser captado pela inteligência no âmbito do conhecimento sensível, de onde o abstrai, para em seguida buscar novos resultados da especulação sem nunca ultrapassar o âmbito limitado do ser sensível.
A METAFISICA de Tomás distingue o ente (existente) da essência e privilegia o ente em relação à essência. O ente pode ser lógico (conceitual) e real.
O ente lógico tem a função de unir mais conceitos, mas isso não significa que para cada ente lógico corresponda um ente real (por exemplo, ao conceito de cegueira não corresponde nenhum ente real). É esta posição do “realismo moderado” que recorre ao poder de abstração do intelecto para explicar os universais. Sobre os quais eu já expliquei em outra aula.
A essência é o “o que é” de uma coisa, mas é apenas potência de ser, pois apenas em Deus potência e existência coincidem; no mundo e no homem não há correspondência entre potência de ser e existência real. Por este motivo, apenas Deus é necessário (possui como próprio o ato de ser), o mundo, ao contrário, é contingente, porque participa no ser de Deus.
O problema dominante é, portanto, estabelecer o que é o ser, ou por que existe o ser e não o nada. Mas a solução pertence ao âmbito do mistério, e ao homem cabe maravilhar-se a cada momento do fato de que tudo o que é existe, enquanto, seria mais lógico que não existisse.
Tudo o que é, é também bom porque é fruto da bondade de Deus. Nessa concepção, Deus se apresenta como Sumo bem.
Dado que Deus é causa da criatura, a própria criatura apresenta algumas semelhanças com Deus. Por outro lado, a transcendência de Deus implica também uma insuperável diferença entre o Criador e o criatura, a ponto de nosso conhecimento de Deus tornar-se impossível, e exprimível apenas por via negativa.
E por falar em conhecimento de Deus, Santo Tomás também se debruçou sobre a necessidade vigente na idade média de provar a existência de Deus. Ele apresenta para isso cinco vias, todas de índole realista (ou seja, considerando algum aspecto da realidade dada pelos sentidos como o efeito e buscar a partir disso a sua causa).
A PRIMEIRA VIA apresentada fundamenta-se na constatação de que no universo existe MOVIMENTO. Baseado em Aristóteles, Santo Tomás considera que todo movimento tem uma causa, que deve ser exterior ao próprio ser que está em movimento, pois não se pode admitir que uma mesma coisa possa ser ela mesma a coisa movida e o princípio motor que a faz movimentar-se. Só pra gente entender. Exemplo: uma bola de sinuca é movida, por outra bola de sinuca que por sua vez pode ter sido movida por outra, até uma que foi movida pelo taco de sinuca, que foi movido por exemplo pelo braço de um jogador, e esse braço foi movido pelo jogador, e seu movimento foi causado pela vontade de ganhar o jogo e assim por diante. Viram que o que é movido também pode ser motor de outro movimento, o próprio motor deve ser movido por um outro, este por um terceiro, e assim por diante. Nessas condições, é necessário admitir a série de motores até chegar a um primeiro motor imóvel, como pensava Aristóteles, que para Santo Tomás, é o próprio Deus.
A SEGUNDA VIA diz respeito à ideia de causa em geral. Todas as coisas ou são causas ou são efeitos, não existe coisa alguma que seja causa de si mesma. Nesse caso, ela seria causa e efeito no mesmo tempo, sendo, assim, anterior e posterior, o que seria absurdo. Por outro lado, toda causa, por sua vez, deve ter sido causada por outra e esta por uma terceira, e assim sucessivamente. Impõe-se, portanto, admitir uma primeira causa não causada, Deus.
A TERCEIRA VIA refere-se aos conceitos de necessidade e contingência. Todos os seres estão em permanente transformação, alguns sendo gerados, outros se corrompendo e deixando de existir. Mas isso é contingente, pois poder ou não existir não é possuir uma existência necessária, já que aquilo que é necessário não precisa de causa para existir. Ou seja: se alguma coisa existe é porque participa do necessário, se algo começa a existir é por causa de algo que já existia antes. Vulgarizando um pouco: para que uma mesa exista, é necessário que material de que ela é feita exista antes, que quem a faz também exista antes dela e assim por diante. E cada coisa existente exige uma cadeia de causas, que culmina no necessário absoluto, ou seja, Deus.
A QUARTA VIA tomista para provar a existência de Deus é de índole platônica e baseia-se nos graus hierárquicos de perfeição observados nas coisas. E caminhando por esses graus, chegamos a uma idéia que seria como uma referência de perfeição. Nesse sentido, deverá existir, portanto, uma verdade e um bem em si: Deus.
A QUINTA VIA fundamenta-se na ordem das coisas. De acordo com o finalismo aristotélico adotado por Tomás de Aquino, todas as operações dos corpos materiais tenderiam a um fim, no sentido de finalidade e não de término. A regularidade com que alcançam seu fim mostraria que eles não estão movidos pelo acaso; a regularidade seria intencional e desejada.
Quantas vezes a gente não olha para a natureza e se admira com essa regularidade, hoje principalmente num mundo em que praticamente matematizamos vários fenômenos pelas leis da física. Se a natureza,  que está privada de  de conhecimento possui essa regularidade, poderíamos concluir, segundo Tomás de Aquino, que há uma inteligência primeira, ordenadora da finalidade das coisas. Essa inteligência soberana seria Deus.
Enfim, depois dessa exposição fica difícil a gente não concordar pelo menos com o argumento de que ele consegue buscar na filosofia pagã um diálogo com aqueles que não acreditam nos escritos bíblicos. Evidentemente, esse tipo de abordagem é tão ampla que acaba deixando de lado algumas especificidade da teologia cristã, pois Deus visto nessa concepção seria uma conclusão racional a partir da observação do mundo e não do estudo da verdade revelada, por isso ela é apologética, permitindo discutir com quem não aceita nenhuma fé.