segunda-feira, 5 de agosto de 2019

John Raws: Uma teoria da justiça | Professor Cristiano





John Rawls (1921 – 2002) nasceu em Baltimore, estudou em Princeton e, depois de uma estadia em Oxford, voltou para os Estados Unidos, passando a ensinar na Universidade de Harvard, onde também ensina seu mais aguerrido e leal adversário: Robert Nozick. Ele é conhecido por ter publicado em 1971 um dos livros mais discutidos – e mais influentes – destes últimos vinte anos: Uma teoria da justiça.
Karl Popper definiu a obra de John Rawls como “um livro importantíssimo sob muitos aspectos”, e apreciou muito a ideia de Rawls segundo o qual é um projeto de vida “que caracteriza as intenções ou as finalidades que fazem de um homem ‘uma pessoa moral unificada, consciente’”. Por sua vez, justamente Robert Nozick escreveu que Uma teoria da justiça “é uma fonte de ideias iluminadoras, fundidas em um conjunto agradável. Ora, os filósofos devem trabalhar dentro da teoria de John Rawls, ou então explicar por que não o fazem […]. Também quem não estiver convencido do desencontro com a visão sistemática de John Rawls aprenderá muito, estudando-o aprofundadamente”. Essas coisas, ditas por seu adversário mais temível, constituem o melhor elogio da obra de John Rawls .

Contra o Utilitarismo

Desde os inícios de seu livro Uma teoria da justiça, John Rawls é claro sobre o fato de que sua teoria é de “natureza profundamente kantiana”; e isso no sentido de que ele põe sua obra na esteira do contratualismo (Locke, Rousseau, Kant), em contraste com a tradição do utilitarismo (Hume, Bentham e Mill). O intento de fundo da obra de John Rawls está na proposta e no exame de princípios em grau de sustentar uma sociedade livre e justa. “A justiça – escreve John Rawls – é o primeiro requisito das instituições sociais, assim como a verdade o é dos sistemas de pensamento”. E logo acrescenta: “uma teoria, por mais simples e elegante que seja, deve ser abandonada ou modificada, se não for verdadeira”. Pois bem, “do mesmo modo as leis e as instituições, não importa o quanto sejam eficientes e bem urdidas, devem ser reformadas ou abolidas se forem injustas”.
Mas quando é que leis e instituições são justas?
Os utilitaristas – pensemos, justamente, em Bentham ou em Mill – perseguiram o ideal do maior bem-estar para o maior número de pessoas; por conseguinte, defenderam uma concepção tal que no fim, de fato, comportava a submissão do indivíduo a sociedade. John Rawls combate tal impostação, enquanto, a seu ver, nenhum homem deve sofrer privações em vantagem de algum outro ou da “maior parte da sociedade”.
“Véu de ignorância e posição originária”
John Rawls , na pesquisa de Uma teoria da justiça, parte daquela que ele chama de posição originária. Esta posição originaria é o estado em que se encontram os indivíduos que devem determinar o contrato. Ela não é uma hipótese de estado de natureza, mais ou menos fictícia. É simplesmente um expediente heurístico imaginado “de modo a obter – afirma John Rawls – a solução desejada”.
Na posição originária, os indivíduos particulares se encontram em uma situação de equidade, isto éde igualdade; e tal equidade deve-se ao véu de ignorância que caracteriza a condição dos indivíduos que se põem na posição originária.
Escreve John Rawls: “Devemos de algum modo zerar os efeitos das consequências particulares que põem em dificuldade os homens, e que os impelem a desfrutar em sua própria vantagem as circunstâncias naturais e sociais. Com este objetivo, assumo que as partes estão situadas por trás de um véu de ignorância. As partes não sabem de que modo as alternativas influenciarão em seu caso particular, e são por isso obrigadas a avaliar os princípios apenas com base em considerações gerais. Assume-se, portanto, que as partes não conhecem alguns tipos de fatos particulares.
Primeiramente, ninguém conhece seu próprio lugar na sociedade, sua posição de classe ou seu status social; o mesmo vale na distribuição dos dotes e das capacidades naturais, sua força, inteligência e semelhantes. Além disso, ninguém conhece sua própria concepção do bem, nem os particulares dos próprios planos racionais de vida e nem as próprias características psicológicas particulares, como a aversão ao risco ou a tendência ao pessimismo ou ao otimismo. Além disso, assumo que as partes não conheçam as circunstâncias especificas de sua sociedade”.

A posição originária faz escolher princípios universais

Pois bem, em urna situação desse tipo, nessa posição originária, o véu de ignorância torna todos iguais. O véu de ignorância não beneficia ninguém; portanto, nenhum dos contraentes poderá propor uma sociedade futura ou instituições em sua própria vantagem; ninguém sabe qual é ou será seu próprio interesse ou privilégio particular.
A posição originária faz com que todos sejam igualmente racionais e reciprocamente desinteressados; é uma situação que obriga todos a escolher princípios universais de justiça, ou, para dizer com Kant – ao qual John Rawls se remete -, princípios de uma moral autônoma que nós mesmos nos damos não como seres interessados nisto ou naquilo, ou como membros desta ou daquela sociedade, mas como seres livres e racionais. “O véu de ignorância – escreve John Rawls – priva a pessoa na posição originária dos conhecimentos que a colocariam em grau de escolher princípios heterônomos. As partes chegam juntas à sua escolha, enquanto pessoas livres, racionais e iguais, conhecendo apenas as circunstâncias que fazem surgir a necessidade de princípios de justiça”.
Os indivíduos que se encontram na posição originária não podem propor princípios ou pensar em uma sociedade em que poderão ser favorecidos eles mesmos ou talvez seus amigos, e desfavorecidos os outros. Ninguém sabe nada nem de si mesmo nem dos outros.
A única escolha possível éentão, a que deverá se referir a todos; tratar-se-á, portanto, de uma escolha de princípios universais de justiça.

Dois princípios de justiça

Na base da proposta dos princípios que constituem “a estrutura fundamental da sociedade” há, portanto, um contrato. As partes contraentes são todos os indivíduos – não conta aqui o tempo nem tem importância nenhuma as gerações – que se põem na posição originária. Objeto do contrato são os dois princípios de justiça, que são princípios morais e que serão expostos em breve. E a motivação que está por trás do contrato e da proposta dos dois princípios é principalmente a de se proteger contra a possibilidade de se encontrar amanhã entre os desfavorecidos.
primeiro princípio de justiça é o seguinte:
“toda pessoa tem direito igual a mais extensa liberdade fundamental, compativelmente com semelhante liberdade para os outros”.
segundo princípio sustenta que:
“as desigualdades econômicas e sociais, como as de riqueza e de poder, são justas apenas se produzem benefícios compensatórios para cada um, e em particular para os membros menos favorecidos da sociedade”.
O primeiro princípio funciona como fundamento das liberdades individuais; ele “requer a igualdade na atribuição dos direitos e dos deveres fundamentais”. O segundo princípio não justifica o sacrifício de alguns, mesmo que ele chegue a produzir um bem maior para alguns ou para a maioria.
Isso é o que o utilitarismo propõe; mas John Rawls é antiutilitarista:
“O fato de que alguns tenham menos a fim de que outros prosperem pode ser útil, mas é injusto”.
As desigualdades econômicas e sociais são admitidas, ou seja, são justas, não por beneficiar os poucos ou os muitos ou os mais, mas apenas com a condição de que favoreçam todos, e de modo especial os mais desfavorecidos.

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