segunda-feira, 21 de março de 2016

O garoto que lia o pensamento


            Era um garoto que sabia ler o pensamento. Aliás, ainda não aprendera a ler, mas já sabia reconhecer o mais íntimo e imediato pensamento das pessoas. Quando o percebeu tinha apenas cinco anos de idade, pensava ser uma potencialidade comum a todas as pessoas até que percebeu ser uma peculiaridade sua. Naquele mesmo tempo tentou dizer à sua mãe o que podia fazer, contudo desanimou-se de agir assim quando leu em seu pensamento: “crianças são crianças, imaginam o que querem e não sabem o que é a vida”. Pensou consigo: “se digo a ela o queria dizer, não reconhecerá nisso a realidade”. Quando entrou para escola, percebeu que nada havia a aprender, pois, quem lhe ensinava, pensava: “o tempo não passa”. Quando alcançou um grau mais elevado se deparou com a vil realidade de quem fingia saber o que ensinava. Por isso, nunca alcançou grandes notas apesar de poder ler o pensamento de quem elaborava as provas; as pessoas que o faziam pareciam esquecer de tudo ou nem mesmo se quer esforçar-se por lembrar-se. Um dia, durante uma prova, disparou a rir sem controle quando reconheceu no pensamento de sua professora uma melodia com a seguinte letra: “Amor I love you!”.
- Por que você está rindo! Está colando por acaso?
- Não professora, como poderia? A senhora não tira o olho de mim!
Na verdade esta era a sua limitação, só poderia ler o pensamento pelos olhos, porta da alma. Paulatinamente descobrira o que havia escondido dentro de cada atitude das pessoas. Mas não era feliz, sabia o que pensavam dele, preferiria nunca saber. Era solitário e assim cresceu sabendo que o que se pensa nunca é externado como se pensa e que era preciso fingir de bobo para viver. Reconhecia a hipocrisia humana, mas, quando a relatava, imediatamente e terrivelmente, sofria a conseqüência desse ato. Correu o mundo a fim de encontrar um homem que realmente fizesse e falasse o que pensava com sinceridade, mas não encontrou. E assim, chegando à margem do desespero, mergulhava no rio da morte pelo suicídio por intoxicação medicamentosa. E os últimos pensamentos que pôde ler foram: “se eu conseguir salvá-lo irei ser promovido!”.

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